Uma das coisas mais deliciosas que ouvi nos últimos dias diz respeito ao figo, fruto tradicionalmente associado ao sul da Europa e norte de Africa. Aqarru é o nome que se dá ao figo em tamazight, língua do povo berbere originário das montanhas do Atlas no norte de Marrocos, e também expressão usada pelos povos rurais da margem esquerda do Guadiana relativamente ao comportamento das ovelhas quando acabam de pastar e se juntam todas à sombra de uma árvore. Então as ovelhas estão no aqarru ou aqarradas.
Ora, se os povos islâmicos que colonizaram o território hoje português seriam na sua maioria berberes do norte de África, pode pensar-se que à margem das respectivas evoluções linguísticas, permaneceu como referente na expressão utilizada naquelas aldeias alentejanas, a ideia de sombra herdada das populações que anteriormente habitaram os mesmos locais, visto que de acordo com as espécies arbóreas existentes, a sombra da figueira seria certamente a mais fresca.
É também este tipo de património imaterial que constitui uma das mais valiosas riquezas da nossa cultura (s) e que merece ser preservado e divulgado, por exemplo pela realização de recolhas orais como base de investigações antropológicas junto de determinadas comunidades locais que devem ser entendidas como fontes inesgotáveis de saber.